As Mallets são locomotivas articuladas que empregam cilindros compostos (coupound) em dois grupos de rodas motrizes. O grupo traseiro são os Cilindros de Alta Pressão, menores, enquanto o dianteiro são os de Baixa Pressão, maiores. O conjunto motriz traseiro é fixo ao longeirão da maquina, alinhado ao eixo da caldeira. Já o conjunto da frente pode se deslocar tanto horizontal quanto verticalmente fixada por um pino entre os cilindros de Alta Pressão.
O conjunto de rodas guia por sua vez é fixado ao de rodas motrizes, formando um truque capaz de inscrever até mesmo em curvas bastante fechadas, instranponiveis a maquinas de esforço de tração equivalentes a das articuladas, mas com bases rígidas. O tubo que recebe vapor para o conjunto de baixa pressão, tanto quanto o tubo de exaustão, que se conecta a caixa de fumaça tem que ser com juntas articuladas. Esses tubos carregam apenas vapor de baixa pressão, não sendo tarefa dificil manter tais juntas suficientemente vedadas.
Superaquecedores foram aplicados a muitas Mallet's, como as fabricadas pelas ALCO em 1913, obtendo resultados mais satisfatorios. Para isso o tubo de vapor passava novamente pela caldeira, após a throttle e antes dos cilindros de Alta Pressão, para evitar problemas com condensação já nos cilindros de Baixa Pressão.
A história das Mallet's da RVPSC, de certa forma começa em 1909, com a Brazil Railway desenvolvendo um projeto para locomotivas de grande capacidade, Mallets do tipo dupla Mogul (2-6-6-2) para suas linhas de bitola de 1000mm nos estados de São Paulo, Paraná, Santa Catarina e Rio Grande do Sul.
As primeiras unidades adquiridas por esse projeto foram fabricadas pela Baldwin Locomotive Works, destinadas a Sorocabana Railway. Suas caracteristicas eram de 12 ton/eixo. Entretanto eram destinadas a linhas de 25kg/m ou mais e servidas de lastro de pedra britada, o que ainda era excessão nas ferrovias da Brasil Railway. Pouco depois foi a vez de uma outra subsidiária da Brazil Railway, a Mogiana Ry. receber duas unidadas, ainda em 1910, e mais duas em 1912.
Mallet Baldwin da Sorocabana, identica as da Mogiana. Observe as rodas por dentro dos longeirões.
Também em 1912, a Brazil Railway adquiriu junto a Henschel para uma ferrovia que viria a compor a RVPSC mais duas Mallet's, destinadas a EFSP-RG, também de 12 toneladas por eixo, destinadas ao trecho da Serra de São Francisco entre Nereu Ramos e Rio Vermelho (SC), que havia recebido "pesados" trilhos de 36kg/m devido ao perfil da linha que tinha aclive médio que passava dos 2%. Ainda assim essas unidades se demonstraram, para a época, demasiado grandes para a as linhas, oficinas e geravam o inconveniente da quebra de tração, sendo logo em 1917 vendidas para a Sorocabana, que já operava Mallet's de 12ton/eixo com sucesso.
Mallet Henschel SP-RG #701, foto promocional do Fabricante. Seriam repassadas a Sorocabana em 1917.
Mesmo com o fracasso das Mallet's de 12 ton/eixo nas linhas do Paraná e Sta. Catarina, a Brazil Ry. obteve sucesso com as Mallet's Compound de 10ton/eixo, que tinham sido projetadas para linhas com menor capacidade de suporte. (Como eram as da EFP e SP-RG. A maior parte dos trechos na SR-RG era de 22,5kg/m e na EFP usava-se trilhos Krupp de 26,1kg/m, o lastro muitas vezes era somente terra batida). Para essas linhas,assim como as de São Paulo e Rio Grande na mesma condição, foram adquiridas essas maquinas leves, de peso total de pouco mais de 71 toneladas, 20 metros de comprimento, valvulas de gaveta tanto nos cilindros de Alta quanto Baixa Pressão. Sua velocidade máxima era em torno de 20km/hora, podendo atingir mais, porém com desgaste acentuado de suas partes móveis. Ao contrario das maquinas até então recebidas pela Sorocabana e Mogiana, essas tinham rodas motrizes externas ao longeirões. Esse viria a se tornar o projeto padrão das maquinas posteriormente recebidas pelas formadoras da RVPSC.
Esse projeto, por sua vez obteve bastante sucesso nas linhas de baixa capacidade, sendo adotadas também pela Sorocana, em suas linhas mais leves e na Auxiliaire do Rio Grande do Sul. Junto a Henschel então, em 1912, foi encomendado um grande pedido, no total de 23 maquinas, destinadas a várias ferrovias que compunham a Brazil Railway, destas, sendo 3 destinadas a Estrada de Ferro Paraná e mais 3 destinadas a Estrada de Ferro São Paulo - Rio Grande. As maquinas foram fabricadas em tempo recorde para a Brazil Railway, tendo a Henschel subcontratado a construção dos tenders na Bélgica. Em seis meses as 23 locomtivas estavam prontas, e foram entregues no Brasil ainda no mesmo ano. Por padrões da Brazil Ry. as maquinas tinham todas as suas dimensões em polegadas, como pode se observar nas plantas das mesmas.
Um novo pedido foi feito em 1913, desta vez a American Locomotive Company, sendo 8 maquinas, quatro delas destinadas a Estrada de Ferro Paraná. Essas Mallet Coupound era quase iguais as Henschel, tendo como diferença apenas uma pequena modernização de projeto, sendo estas dotadas de super-aquecedor e valvulas tipo pistão para os cilindros de Alta Pressão.
Na EFSPRG as Mallets cobriam inicialmente os trechos de entroncamento com a EFS a norte e com a Auxiliaire ao sul, pois eram alguns dos piores de sua linha, sendo posteriormente retificados. Na EFP o emprego inicial foi obviamente no trecho entre Paranaguá e Curitiba, por ter uma rampa quase constante de 3% por 60km, local aonde as Mallets conseguiam atingir sua capacidade máxima de tração em baixas velocidades, de 15 a 20km/h, condição ideal de operação para as maquinas.Mais tarde as Mallets começaram a ir até a Ponta Grossa, já que a linha ainda tinha seu traçado original, com muitas rampas de 2,5% e curvas de menos de 120 metros, que causavam grande resistencia ao trem.
Com a falencia da Brazil Ry. e reorganização das ferrovias que a compunham, a situação das Mallets pouco foi alterada, ficando praticamente com os mesmo serviços até a criação da RVPSC. Já em tempos de RVPSC as Mallets começaram a se demonstrar vagarosas demais para a linha entre Curitiba e Paranaguá, e gradualmente foram sendo substituidas nesse trecho por 2-8-2 Mikados, que mesmo com menor esforço de tração (8880kgf) podiam trafegar a maior velocidade, aumentando o fluxo de vagões/dia no trecho. Em 1941 foi determinado que a série de 10 Locomotivas Articuladas seria a 1000. As maquinas até então em operação foram renumeradas assim:
EFP Henschel 601 a 603 -> RVPSC 1001 a 1003
EFP Alco 604 a 607 -> RVPSC 1004 a 1007
SPRG Henschel 601 a 603 -> RVPSC 1008 a 1010
Nos anos 30 e 40 Mallet's começavam a se apresentar maquinas superadas tecnológicamente, como pode ser observado pelas estatisticas anuais da RVPSC. Em 1929, pior ano na operação das Mallet's, elas tiveram disponibilidade média de 59%, ou 215 dias,excetuando-se as revisões prévistas. Mas esse foi um ano de muitas restrições e falta de demanda por transportes. Apenas como comparação as 2-8-0 Consolidation, que tiveram a maior disponiblidade do ano obtiveram 80%. Já em 1937, com a economia novamente aquecida as Consolidation mantiveram 75% de disponibilidade, enquanto que as Mallet's, já em uso menos intenso, obtiveram 100% de disponibilidade média, ou seja, todas as maquinas estavam disponiveis nos 362 em que a RVPSC operou naquele ano. Lembrando que manutenção programada não era computada nessa estatística.
Porém, os mesmos relatórios mostram que as Mallet's, já nessa época eram mais de 90% mais custosas em manutenção que qualquer outra maquina, incluindo as possantes, porém na época novas, 2-8-2 Mikado. A década de 30 e o período da II Guerra foram bastante penosos para a RVPSC, que tinha restrições de importações e sofria com o periodo pós crise de 29. Seus trilhos estavam severamente desgastados, de suas 139 locomotivas em 1935, apenas 39 condiziam com o serviço que prestavam, muitas tinham mais de cinquenta anos de uso e todas mais de vinte anos.
Em 1946 uma ultima encomenda de Locomotivas 2-6-6-2 seriam feitas, porém dessa vez não eram Locomotivas Mallets e sim Locomotivas Articuladas de Simples Expansão, com a principal diferença sendo a falta de cilindros compostos (coupound), tendo seu vapor sendo expelido diretamente aos quatro pistões da Locomotiva.